A crise de liquidez é uma das situações mais críticas que uma empresa pode enfrentar. Quando os passivos superam a capacidade de geração de caixa e a inadimplência se torna rotina, muitos empresários enxergam apenas dois caminhos: a paralisação das atividades ou a falência.
No entanto, há alternativas legais e financeiramente estratégicas capazes de reverter esse cenário. Duas delas, que vêm se mostrando cada vez mais eficazes quando aplicadas de forma conjunta: são a recuperação judicial e a transação tributária.
Mas como esses dois instrumentos se relacionam? Quais os requisitos legais e operacionais para sua aplicação? E quais os impactos práticos para o passivo tributário e a viabilidade do plano de recuperação?
Neste artigo, respondemos a essas e outras perguntas com base na legislação, dados de mercado e casos reais.
Recuperação Judicial: instrumento de reestruturação empresarial
A recuperação judicial é um mecanismo jurídico previsto na Lei nº 11.101/2005, que permite que empresas em grave situação financeira reorganizem seus passivos com o aval da Justiça e sob a supervisão dos credores. Seu objetivo é claro: evitar a falência, preservar empregos e manter a atividade econômica, oferecendo um plano de pagamento viável para todos os envolvidos.
O processo é iniciado com o ajuizamento do pedido de recuperação judicial e, se aceito, o devedor apresenta um plano de recuperação, que precisa ser aprovado em assembleia de credores. Esse plano deve conter medidas para reorganização financeira e operacional — incluindo propostas de pagamento, venda de ativos, renegociação de dívidas e ajustes estruturais.
Importante destacar que o deferimento da recuperação suspende por 180 dias as ações e execuções contra a empresa, conferindo a chamada “blindagem judicial”. Essa suspensão cria um ambiente de negociação mais equilibrado, inclusive com o Fisco.
Segundo dados do Serasa Experian, mais de 2,2 mil empresas entraram com pedidos de recuperação judicial em 2024 — o maior número da história. O maior volume foi registrado entre empresas de médio porte, pressionadas por juros altos, retração da demanda e dívidas fiscais.
A transação tributária e sua função estratégica no passivo fiscal
A transação tributária, por sua vez, é um mecanismo de resolução consensual de conflitos entre o Fisco e o contribuinte, introduzido no ordenamento jurídico pela Lei nº 13.988/2020. Trata-se de um acordo por meio do qual a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) renuncia parcialmente ao crédito tributário em troca da regularização da dívida.
O grande diferencial da transação está na flexibilidade das condições de pagamento e na possibilidade de adequação da cobrança à capacidade de pagamento do devedor. Isso significa que, ao contrário dos parcelamentos tradicionais, a transação permite:
- Redução significativa dos encargos legais (juros, multas e encargos da Dívida Ativa);
- Uso de créditos de prejuízo fiscal e base negativa de CSLL para abatimento;
- Pagamento de entrada simbólica (6% do valor total, em até 12 parcelas);
- Prazo estendido que pode alcançar até 145 meses, a depender do perfil do contribuinte;
- Suspensão da exigibilidade dos débitos após a formalização do acordo.
Além disso, há modalidades específicas para empresas em recuperação judicial, conforme previsto nas Portarias PGFN nº 14.459/2023 e nº 721/2025. Essas normas atualizam critérios de elegibilidade, regras de capacidade de pagamento e condições de renegociação.
Como a transação atua no contexto da recuperação judicial
Empresas em recuperação judicial enfrentam passivos com credores diversos — e o Fisco costuma figurar entre os maiores. A depender do volume da dívida ativa e do seu peso dentro do plano de recuperação, a negociação com a União pode ser o ponto de viabilidade (ou inviabilidade) do plano como um todo.
Nesse cenário, a transação tributária surge como um dos instrumentos mais poderosos de reestruturação, com impactos diretos:
- Redução do passivo fiscal consolidado — o que melhora os índices contábeis e demonstra solidez perante os demais credores;
- Melhora do fluxo de caixa — graças aos prazos estendidos e à entrada facilitada;
- Aprovação mais célere do plano de recuperação — uma vez que a regularização fiscal evita contestações e acelera a tramitação processual;
- Possibilidade de reenquadramento de regime tributário — após a regularização, empresas podem retomar o Simples Nacional ou usufruir de regimes especiais suspensos pela inadimplência.
Além disso, o reconhecimento da capacidade de pagamento “insuficiente” ou “mínima” pela PGFN amplia os percentuais de desconto, o que potencializa o resultado econômico da transação.
Case real: o caso do Grupo João Santos
O Grupo João Santos, controlador da marca Cimento Nassau, protagonizou o maior acordo de transação tributária da história da PGFN.
Com uma dívida superior a R$ 11 bilhões, o grupo buscou a transação como alternativa à falência. O acordo permitiu a reestruturação fiscal e possibilitou a retomada das operações industriais em diversos estados.
Esse caso evidencia a postura mais colaborativa da PGFN e reforça a relevância da transação como instrumento de política pública econômica, voltado à manutenção da atividade produtiva.
O que a empresa precisa para aderir?
Nem toda empresa em recuperação judicial está automaticamente apta à transação tributária. São exigidos critérios objetivos:
- Pedido de recuperação judicial já deferido;
- Débitos inscritos na Dívida Ativa da União (não se aplicam a débitos ainda em fase administrativa);
- Regularidade cadastral no CNPJ;
- Apresentação de documentos via e-CAC, incluindo a Procuração Digital da PGFN;
- Simulação e proposta de pagamento compatível com a capacidade financeira do devedor.
Além disso, a empresa precisa evitar a inadimplência das parcelas, pois a rescisão do acordo implica retomada da cobrança judicial integral, sem os benefícios pactuados.
Conclusão: uma nova rota para empresas viáveis, mas sufocadas
A união entre recuperação judicial e transação tributária tem se consolidado como um verdadeiro ponto de virada para empresas em situação de crise.
Mais do que instrumentos jurídicos isolados, essas ferramentas, quando utilizadas estrategicamente, oferecem segurança, previsibilidade e sustentabilidade financeira. Trata-se de uma alternativa concreta para preservar negócios economicamente viáveis, manter empregos e fomentar a retomada da atividade econômica.
Se a sua empresa enfrenta um cenário de passivo tributário elevado e dificuldades operacionais, é essencial contar com apoio técnico especializado. O diagnóstico preciso da dívida e a projeção de viabilidade da transação fazem toda a diferença entre o fracasso e a reconstrução.
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